segunda-feira, 1 de novembro de 2010

O Gente


 

 

Como todos sabem, gente são aqueles alunos que vagueiam pela escola, são excluídos dela por não terem o padrão social que a escola espera. Gente era um menino de 11 anos, já com sério comprometimento com as drogas.

No início do ano, logo que entrei na sala e vi-o sentando no fundo, senti que carregava um peso enorme em suas costas, assim como era de se esperar, começou a me desafiar. 

Criticava alto, reclamava de tudo, fazia barulho com a cadeira, queria sair toda hora. Os outros me olhavam esperando expulsar-lo da sala. 

O via vagando pela escola o tempo todo, fugia nas últimas aulas, faltava uma semana inteira. Nem conseguia fazer lição alguma. 

Sentia-o muito, muito ferido e triste. 

Algumas vezes, quando passava perto dele tentava abraça-lo, ao que  se esquivava de uma maneira quase brutal. Outras vezes, chegava perto dele na carteira e simplesmente ria de sua ironia boba sem me preocupar muito com o conteúdo de suas palavras. 

Certa vez, estava distraído e dei uma espécie de chave de braço no pescoço, dizendo que o havia pegado e era meu agora, teria que assistir as minhas aulas,  ele riu, sem entender direito. 

Tentamos algumas coisas, mas ele pouco vinha e quando via estava com muita raiva.

Como ele vagava muito, não havia uma Constância de comunicação, assim a afetividade e aceitação dele comigo pensava que ficara comprometida. 

Já com um mês que ele não aparecia, veio com carga total, estava mais revoltado, enfurecido do que nunca. Eu devia estar na minha (TMP ) porque perdi a paciência, pedi para sair da sala e disse que não assistiria mais minhas aulas, que eu faria como todos ignoraria que ele existe. 

E assim se deu o dia, fiquei nervosa e completamente contraria aquilo que prego e acredito.

Dia seguinte, esta no corredor em frente à sala de aula querendo entrar, não entra. Chama a coordenadora para avisar que não entrou porque eu tinha dito que ele não assistiria a minhas aulas mais. 

Vinha subindo as escadas e vi-o com a coordenadora que, lógico, iria chamar minha atenção. Ela até estranhou o que ele disse, achando ser mentira, pois conhecia meu trabalho. 

Pedi para falar com ele em particular, olhei em seus olhos e disse-lhe que estava muito chateada por ter tratado ele daquela foram e pedi desculpa.

Ele olhou-me e virou a cabeça se esquivando,  busquei seu rosto pelo queixo, quando vi que ele chorava, sem entender direito perguntei por que você esta assim tão triste, quando para minha surpresa o problema não era que eu o havia expulsado da sala, e sim que no meio do meu nervoso eu disse-lhe, eu não gosto mais de você. 

Repetiu com todas as letras: A Senhora disse que não gosta mais de mim.

Fiquei tão emocionada dei-lhe um grande abraço e disse que o amava, pedi novamente desculpa por não ter paciências com as coisas dele. Assim, entramos na sala. 

Ele tentava fazer a lição colaborar, mas pouco durou. Pois, logo recebi a noticia que a família veio à escola e o transferiu. 

Todos os professores comemoraram, eu e a coordenadora que presenciamos tudo, sabíamos que a história era outra.

E hoje tenho o que vivi e posso contar. 

Espero que ele esteja bem onde quer que ele esteja.

Espero que ele tenha recebido amor de mais alguém além de nossa pequena experiência.

Espero finalmente a paz.

Extraído do livro Dimensão da Comunicação vol 3

Huliel

 

 

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